quinta-feira, 4 de outubro de 2012

A Força das Súmulas do STJ

Em dois recentes julgados, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) suspendeu decisões que contrariaram entendimentos já sumulados por aquela Corte Superior no seu papel pacificador de controvérsias de seu próprio entendimento e de unificador da interpretação das leis federais. Numa delas, a Ministra Laurita Vaz, por meio de Habeas Corpus suspendeu decisão de Juiz que se recusou expressamente a aplicar a Súmula 440 do STJ, determinando que o réu fosse colocado imediatamente em regime semiaberto, até decisão de mérito pela Quinta Turma. A Súmula 440 estabelece que, uma vez fixada a pena-base no mínimo legal, “é vedado o estabelecimento de regime prisional mais gravoso do que o cabível em razão da sanção imposta, com base apenas na gravidade abstrata do delito”. Vale ressaltar ser esse também o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF). O Juiz de São Paulo (SP), apesar de ter fixado a pena base no mínimo legal, justificou a não aplicação da mencionada súmula pois os crimes praticados pelo réu demonstravam conduta absolutamente reprovável e que causa verdadeiro pânico, entendendo que o regime inicial adequado deveria ser o fechado. O Tribunal de Justiça de SP havia acompanhado o posicionamento do Magistrado. A Ministra Relatora entendeu que a fundamentação se baseou em opinião pessoal e subjetiva do Juiz. Noutra decisão, prolatada numa Reclamação dirigida àquela Corte da Cidadania, o Ministro Humberto Martins concedeu liminar para suspender decisão de Turma Recursal dos Juizados Cíveis, do Estado do Acre, que não tinha reconhecido desvio de função de policial temporário que teria sido colocado para trabalhar como agente penitenciário o que, a princípio, violaria a Súmula 378 do STJ que pacificou o entendimento que “reconhecido o desvio de função o servidor faz jus às diferenças salariais decorrentes”. Nesse caso, o Ministro entendeu presente a fumaça do bom direito, uma vez a decisão não reconheceu o desvio de função que já havia sido admitido pelo próprio Estado do Acre, apresar do Requerente haver perido nas duas instâncias anteriores. Do mesmo modo, Humberto Martins entendeu configurado o perigo na demora já que não se admite reclamação de decisão já transitada em julgado. Como precedente, foi citado o Recurso Especial 1.091.539, submetido ao rito dos recutrsos repetitivos (art. 543-C do CPC). A decisão ainda terá que ser confirmada pela Primeira Seção do STJ. * esse texto foi publicado na coluna semanal do Jornal A Crítica aos 28.09.2012.

Dano Presumido

Voto vencedor - merecedor de aplausos - do Ministro Mauro Campbell Marques, na 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), consagra tese da desnecessidade de se provar risco de dano irreparável para decretação de indisponibilidade de bens nas Ações de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92). A corrente jurisprudencial criada por Mauro Campbell prestigia a tutela de “evidência” e não a tutela de urgência, dando um “plus” ao posicionamento já existente no STJ, de que somente poderia ser deferida medida cautelar de indisponibilidade de bens, em ação civil pública por improbidade administrativa, de modo suficiente a garantir o integral ressarcimento de eventual prejuízo ao erário, levando-se em consideração, ainda, o valor de possível multa civil como sanção autônoma. Campbell assentou que nesses casos o periculum in mora seria oriundo da gravidade dos fatos e do montante do prejuízo ao erário que atinge toda a coletividade e não da intenção do agente dilapidador do patrimônio público. Assim, o periculum in mora seria “implícito” à garantia do ressarcimento, “presumido” à garantia de recuperação do patrimônio do público, da coletividade, bem como do acréscimo patrimonial ilegalmente auferido. No seu entender, o bloqueio de bens milita em favor da sociedade, verdadeiro requerente na lide representado pelo Ministério Público. O ministro justifica seu posicionamento no REsp 1319515 defendendo que, diante da ocultação ou dilapidação patrimoniais, por velozes tráfegos e instrumentos tecnológicos de comunicação de dados, tornar-se-ia irreversível o ressarcimento ao erário e a devolução do produto do enriquecimento ilícito por prática de ato ímprobo. Para ele, a própria Lei de Improbidade Administrativa, buscando dar efetividade ao seu conteúdo, afastou o requisito da demonstração do periculum in mora, intrínseco em toda medida cautelar sumária. Vencidos os Ministros Napoleão Nunes Maia Filho e Cesar Asfor Rocha. * esse texto foi publicado na coluna semanal do Jornal A Crítica aos 14.09.2012.

Corrupção e Improbidade

A atuação do Poder Judiciário em crimes de lavagem de dinheiro, corrupção e improbidade administrativa, referente aos primeiros oito meses deste ano, foi divulgada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Esse levantamento, que serviu de base para apresentação perante o Grupo de Revisão da Implementação da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção (UNCAC), demonstrou que só o STF julgou 108 processos (ações penais e recursos) relacionados a crimes de lavagem de dinheiro, corrupção e improbidade administrativa. Comparando com todo o ano anterior, o número supera em 20% o total de julgamentos realizados pela Suprema Corte sobre essas matérias em 2010 (88 no total). Das ações julgadas pelo STF até agosto de 2011, 94 tratavam sobre improbidade administrativa, 8 sobre crimes de corrupção e 6 sobre lavagem de dinheiro. Nesse mesmo período, mais 129 processos desse tipo ingressaram na Corte, contra 178 propostos durante todo o ano passado. Nos oito primeiros meses deste ano, 99 ações dessa natureza transitaram em julgado no STF, não cabendo mais recurso para contestar a decisão. O número supera em cerca de 40% o total de processos concluídos em 2010 em relação aos mesmos temas (71 no total). O Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgou 626 casos dos 889 em tramitação. No período, o STJ recebeu 611 novas ações. Nos tribunais estaduais, os casos de improbidade administrativa ficaram em torno de 10 mil, número muito superior ao de processos por corrupção e lavagem de dinheiro, de acordo com dados fornecidos pelos próprios tribunais. O Brasil também foi avaliado por especialistas e peritos do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) acerca do cumprimento da Convenção, a legislação brasileira e os procedimentos adotados pelos órgãos envolvidos, recebendo sugestões no sentido de aperfeiçoar os mecanismos de prevenção aos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro. A propósito, encontra-se em tramitação no Congresso Nacional Projeto de Lei que torna crime hediondo crime de corrupção na saúde e na educação. * esse texto foi publicado na coluna semanal do Jornal A Crítica aos 07.09.2012.

Mensalão

O Supremo Tribunal Federal (STF), após adotar metodologia de voto por tópicos, julga o item 3 da denúncia do Ministério Público, a saber, desvio de verbas na Câmara dos Deputados e no Banco do Brasil e condena cinco dos trinta e oito réus do mensalão, sendo quatro por unanimidade. Apenas o ex-Presidente da Câmara, Deputado João Paulo Cunha, foi condenado por maioria de votos por corrupção passiva e peculato, já que o ministro revisor, Ricardo Lewandovsky, e Dias Toffoli, votaram por sua absolvição. Com relação a lavagem de dinheiro o voto do Ministro Presidente Ayres Britto irá definir a questão já que cinco ministros votaram pela condenação e quatro pela absolvição. Como previsto, o julgamento do mensalão já começou a influenciar as eleições, já que alguns sites de notícias já estão prevendo a desistência do petista à candidatura para a Prefeitura de Osasco, em razão da condenação por órgão colegiado que o transforma em ficha suja. A dosimetria da pena será votada ao final, já tendo o Presidente anunciado que mesmo quem votou pela absolvição poderia votar na dosimetria. Cesar Peluzo que se aposenta compulsoriamente já sugeriu a pena de 6 anos para João Paulo Cunha e 16 anos para Marcos Valério. Ainda restam sete tópicos da denúncia e trinta e três réus a serem julgados, lembrando que o próprio Ministério Público pediu a absolvição de dois réus por falta de provas o que foi acatado pelo Ministro Relator, um deles ex-Ministro do Governo Lula. As razões do pedido de absolvição do MP fora refutados pelos advogados que querem a absolvição por inocência. * esse texto foi publciado na coluna semanal do Jornal A Crítica aos 31.08.2012.

Guerra Fiscal – SP X AM

É muito comum no Brasil o prestígio a uma legislação quando esta vem de encontro aos seus próprios interesses e a rejeição da mesma norma quando esta contraria suas pretensões. É exatamente o que está ocorrendo na guerra fiscal provocada pelo Estado de São Paulo (SP), ao ajuizar a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4832, perante o Supremo Tribunal Federal (STF). A mencionada unidade da Federação quer que a Lei Complementar nº 24/75 valha para obrigar o Estado do Amazonas a pedir autorização do Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ) sempre que for conceder incentivos fiscais (Parágrafo 2º, do Artigo 2º, do Artigo 1º) mas, ao mesmo tempo, ignora o art. 15 da mesma lei que diz, expressamente, que o disposto nessa legislação não se aplica às indústrias instaladas ou que vierem a se instalar na Zona Franca de Manaus (ZFM), dispositivo legal esse, a princípio, recepcionado pelo art. 40 das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal (CF) de 1988, quando manteve a ZFM pelo prazo de 25 anos. Como o Estado de SP ajuizou, concomitantemente, ações similares contra legislações estaduais dos Estados de Santa Catarina, Rio de Janeiro e Bahia, está colocando no mesmo “balaio de gatos” o Estado do Amazonas e a Zona Franca de Manaus, que detém privilégios garantidos constitucionalmente. Esse novo episódio da guerra fiscal foi deflagrado no último dia 17/08 quando o Estado de SP se insurgiu contra a Lei Estadual nº 2826/2003 e o Decreto Estadual 23.994/2003, trazendo insegurança a investidores e ao Polo Industrial de Manaus (PIM). São Paulo entende que o dispositivo legal que excepcionou a Zona Franca de Manaus ao cumprimento da exigência de decisão do CONFAZ, para concessão de benefícios relativos ao ICMS, não teria sido recepcionado pela Constituição Federal, além de violação ao art. 155, parágrafo 2º, inciso XII, alínea “g”, da Carta Política Federal, que diz que cabe a Lei Complementar regular a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados. A ADI foi distribuída para a Ministra Rosa Weber que aguarda informações do Estado do Amazonas e da Assembléia Legislativa do Estado do Amazonas para poder se pronunciar sobre o pedido liminar. Caso sejam suspensos os efeitos da Lei e do Decreto, poderão ser afetados, também, os Fundos da Universidade do Estado do Amazonas, de Desenvolvimento do Interior e da Mircroempresa, Cooperativas e Assistência Social. * esse texto foi publicado na coluna semanal do Jornal A Crítica aos 24/08/2012.

Uso de Águas Públicas

A cobrança pelo uso do espaço físico sobre águas públicas, instituída pela Portaria SPU/MP 24, de 26/01/2011, da Secretaria de Patrimônio da União (SPU), que prevê a regularização das estruturas náuticas sobre espelhos d'água de domínio da União, foi impugnada perante o Supremo Tribunal Federal (STF) pela Associação Brasileira dos Terminais Portuários (ABTP), que ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 4819) perante aquela Corte Suprema. A ABTP, que representa mais de 100 terminais portuários de uso exclusivo misto e público em todo o país, nos quais circula 90% da carga gerada pelo comércio exterior brasileiro, defende ser inusitada a portaria, tendo em vista a atividade portuária já ser disciplinada pela Lei de Portos (Lei nº 8.630/93). A associação de portos sustenta não existir lei que dê suporte à cobrança e que preveja a base de cálculo a ser aplicada e, considerando ser imprescindível à prestação do serviço portuário a utilização de espaço físico em terra e águas públicas (indissociável), na concessão, permissão ou autorização concedida pela União já estaria incluída a utilização concomitante do espaço físico em terra e em água pública, devendo ser observada apenas a lei especial (de Portos). Analisando a natureza jurídica dessa cobrança, denominada na portaria da SPU de “retribuição pela cessão de uso”, estudiosos do Direito Tributário, sustentam o descabimento da cobrança e mencionam jurisprudências do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que, de um lado, inadmite a cobrança de valores inominados, não enquadráveis nas formas típicas previstas na Constituição Federal e, de outro, não admite cobrança de valores pela estruturas essenciais à prestação do serviço (ex.: remuneração mensal do uso de vias públicas para instalação de serviços de telecomunicação). Ressalte-se, ainda, que no caso da portaria a cobrança seria realizada diretamente pela União (SPU), sem que a ela esteja atrelada delegação de atividade, prestação de serviço ou exercício do poder de polícia. Doutro lado não seria o caso de de preço público, pedágio e muito menos de tarifa (até porque esta é cobrada pelo concessionário ou permissionário e não pelo Poder Público). Todas essas questões conduzem ao não cabimento da cobrança. O STF já decidiu caso similar em hipótese de cobrança de taxa de uso e ocupação do solo e espaço aéreo de concessionárias de serviço público. Foi firmado o entendimento, nesse caso, que ao concessionário era dado o poder-dever de utilizar o domínio público necessário à prestação de serviço. E há um agravante no caso da cobrança de taxa pelo uso de águas públicas em terminais portuários, essa exigência só viria onerar ainda mais o serviço. * esse texto foi publicado na Coluna Semanal do Jornal A Crítica aos 17.08.2012.